quinta-feira, 12 de julho de 2012

Os bastidores da crise da saúde

Jornal do BrasilJorge Darze
A crise da saúde pública tem sido uma grande preocupação da nossa população, que em recentes pesquisas apontou como prioridade a ser assumida pelos futuros governos. Além de negarem o que está ocorrendo, os governantes anunciam supostas melhorias no setor, fazendo-nos lembrar dois personagens do humorista Chico Anysio: o coronel Pantaleão e sua companheira Terta. Ao revelar situações absurdas, ele perguntava: “É mentira, Terta?”. E ela respondia: “Verdade!”. O recente incêndio no Hospital Estadual Pedro II, em Santa Cruz, trouxe à tona, mais uma vez, a irresponsabilidade dos gestores, que, mesmo sem explicarem as causas do ocorrido, intempestivamente determinaram o seu fechamento, o que causou enorme prejuízo à população. Além de sobrecarregar os já sobrecarregados hospitais das proximidades, o governo anunciou a entrega do Pedro II ao município, que por sua vez já determinou o seu repasse a uma empresa privada que irá geri-lo. Felizmente, o Conselho Municipal de Saúde, entendendo que não há justificativa para o seu fechamento, determinou a anulação deste procedimento e obrigou o Estado a reabri-lo para somente depois voltar a discutir a possibilidade da sua municipalização. Outro hospital da mesma rede, o Albert Schweitzer, passou por situação similar e, na ocasião, o governo alugou um gerador e não interrompeu o atendimento. 
Parece que, ao invés de abrir, a ordem é fechar leitos. Depois do Iaserj e dos seus ambulatórios, fecharam o Instituto Estadual de Infectologia São Sebastião, em plena epidemia de dengue, que registrou número elevado de mortes. Há vários meses e silenciosamente, outro hospital estadual, o Carlos Chagas, vem sendo fechado gradativamente, ao fazer cair o número de atendimentos, há alguns anos de 25 a 30 mil pacientes/mês para aproximadamente 2.500. O mais estarrecedor é que no passado, com número dez vezes maior de pacientes atendidos, eram registradas em média 180 mortes por mês e, hoje, este número é o mesmo, apesar da redução de atendimentos, devido a sua desativação progressiva e à perda de qualidade no atendimento. Já as UPAs, meninas dos olhos dos nossos governantes, estão quase todas desfalcadas de médicos e não funcionam, levando a população a passar até seis horas esperando atendimento, o que, além de ser um grave desrespeito, compromete seriamente o prognóstico dos pacientes. As internações não têm o acompanhamento devido, e o que deveria ser uma permanência de no máximo 48 horas, por falta de leitos na rede passa a ser de vários dias. Aliás, como não houve investimento na criação de novos leitos e centenas foram fechados, este passou a ser um dos mais graves problemas da crise. A situação é pior quando se trata de leitos de terapia intensiva, pois, em relação aos demais, o chão e os corredores dos hospitais têm sido frequentemente utilizados. Não sabemos se, por ironia, surgiu uma nova classificação para essas novas “enfermarias”, agora chamadas de “corredores assistidos”. Assistidos por quem? Muitos destes pacientes acabam morrendo por falta de condições de atendimento, existindo indícios de homicídio doloso, o que cabe ao Ministério Público esclarecer.
A epidemia da falta de médicos está também no sistema móvel de atendimento. São inúmeras as denúncias de que ambulâncias circulam com pacientes em estado grave, acompanhados por cabos e sargentos, que evidentemente não possuem a devida habilitação. A chegada de ambulâncias com pacientes graves a unidades que já estão superlotadas de pessoas na mesma situação tem submetido os médicos a grande tensão para decidir sobre as internações – o que não é da sua responsabilidade mas, sim, das autoridades. Nestes casos, têm sido frequentes as ameaças de prisão de médicos plantonistas nos hospitais. Tais ameaças parecem ter sido superadas com a recente portaria da Secretaria de Segurança Pública, que proibiu a condução de qualquer médico para delegacias policiais durante a jornada de trabalho. 
Outro ponto de igual gravidade na crise é a falência da política de recursos humanos. Erradicaram do sistema o concurso público, optando pela terceirização, que colide com a Constituição federal. Paga salários quatro vezes maiores que os dos servidores públicos e não corrige o déficit. Isso estabelece a discriminação salarial, secundariza a aferição de competência e faz crescer avassaladoramente a inexperiência profissional. Esse processo seletivo é extremamente fragilizado, além de facilitar o ingresso de falsos profissionais. Tudo isso só acontece devido à opção política das nossas autoridades de trilhar os caminhos da ilegalidade. Esperamos que o STF, prestes a julgar várias ações sobre o assunto, reconheça a ilegalidade de tal projeto.

Jorge Darze

*Presidente do Sindicato dos Médicos do RJ

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